A hora da reforma tributária
Rodrigo Rocha Loures *
Os sólidos fundamentos da economia brasileira foram os grandes responsáveis pela atenuação, entre nós, dos efeitos da crise financeira internacional que varre o mundo desenvolvido e os países em desenvolvimento. Uma confortável posição de reservas externas, uma política cambial ajustada, uma inflação sob controle e um setor financeiro sadio e bem regulado, permitiram ao Brasil enfrentar os percalços da crise com efeitos colaterais razoavelmente administráveis. Fortalecer e consolidar esses fundamentos são uma tarefa que deve transformar-se em compromisso de todos, governo e setor privado.
E esse fortalecimento e essa consolidação passam pelas reformas, uma das quais, e mais urgente, é a reforma tributária. Entendemos que ela deve ser uma prioridade para as atividades do Legislativo e em especial, da Câmara dos Deputados, no período legislativo que se inicia. É improcedente o argumento de que, em virtude da crise econômica, não seria recomendável aprovar uma reforma tributária. Ao contrário, a melhor oportunidade é justamente a da crise, pois possibilita que seu enfrentamento se faça através de correções de caráter permanente, que consolidam e fortalecem os fundamentos da economia, permitindo a criação de condições objetivas para a retomada do crescimento econômico em bases mais sólidas.
No ano passado já avançamos bastante no exame da matéria. Os trabalhos da Comissão Especial da Reforma Tributária, da qual tenho a honra de integrar, foram concluídos no final de outubro do ano passado com a apresentação do parecer do relator, deputado Sandro Mabel, resumindo os fundamentos, os objetivos e as características da reforma tributária. Foram examinadas 14 Propostas de Emenda à Constituição que estão tramitando na Câmara dos Deputados sobre o assunto. Oito audiências públicas discutiram com todos os setores envolvidos os pormenores do projeto. O interesse dos parlamentares ficou expresso na apresentação de 485 emendas, das quais mais de 200 foram acolhidas pelo relator.
O projeto sugere medidas imediatas de desoneração dos investimentos e da folha de salários, redução da cumulatividade, regularização do fluxo de aproveitamento de créditos, mecanismo de aproveitamento automático de créditos acumulados e atenuação do impacto regressivo da tributação do consumo sobre as menores rendas mediante tratamento favorecido dos alimentos da cesta básica, além de um forte impulso à regionalização do desenvolvimento. Tentou-se uma reforma tributária pragmática, moderada, consensual, gradualista, cercada de garantias de respeito aos direitos do contribuinte e acatamento das situações constituídas, compensação de perdas e mecanismos de correção. Estabilidade, previsibilidade, confiabilidade, segurança e gradualismo são as características da proposta, cuja essência foi aceita pela grande maioria dos parlamentares e de seus respectivos partidos.
São mínimos os pontos de discordância, envolvendo principalmente as formas de compensação de perdas aparentes de uns Estados em detrimento de ganhos de outros. Em louvável esforço em favor do consenso e do diálogo, o relator da reforma decidiu apresentar às lideranças partidárias a minuta de uma emenda global aglutinativa, propondo ajustes no substitutivo aprovado pela Comissão Especial. Seu propósito é construir um texto que acomode, na medida do possível, demandas dos partidos da oposição e dos Governadores por alterações, na tentativa de viabilizar um acordo para aprovação da reforma no plenário da Câmara ainda neste semestre.
Esse passo final, para a aceitação da reforma, exigirá a compreensão e o espírito público principalmente da parte dos Governadores dos Estados mais desenvolvidos. No longo prazo, todos ganham. No curto prazo, os que ganham compensam os perdedores eventuais.É indispensável ter a compreensão de que, para que todos ganhem, todos têm que ceder um pouco. Não se chegará a lugar nenhum se todos quiserem sempre ganhar tudo.
* Rodrigo Rocha Loures é deputado federal (PMDB-PR), membro da Comissão Especial da Reforma Tributária da Câmara Federal.