Transporte Urbano. ( escrito em 96)
O Sistema de Bogotá.
O sistema implantado em Bogotá na Colômbia é muito parecido ao atual, em uso em Curitiba. Assemelha-se aos estudos que conheci no passado em poder do IPPUC e que tinham como base as proposições do arquiteto Jaime Lerner e outros técnicos, traduzidos em projetos iniciados nos anos 70. Na verdade eu já ouvira, em outra oportunidade, a defesa de sistema semelhante ao de Bogotá, com, por exemplo, a possibilidade de ultrapassagens nas canaletas, levada a termo por um de seus autores o professor curitibano Garrone Reck ao tempo em que era Diretor na COMEC o arquiteto Orlando Busarello. Sim o sistema em uso na cidade de Bogotá, na Colômbia, tem entre seus principais autores, vários curitibanos e paulistas, como nos contou o colombiano Ignacio Guzman e os veículos lá utilizados são fabricados pela Volvo em Curitiba e pela Mercedez Bens em São Paulo.
Como funciona? Pode-se dizer, em princípio, que o sistema de Bogotá, mal comparando a um modelo orgânico, se assemelha ao acomodar-se dos intestinos na cavidade abdominal. Ou seja, linhas circulares, num traçado de semicurvas e curva em transposição sem entroncamentos de transferência que sejam, digamos, significativos; algo como se fossem linhas de grande vazão em circulação contínua. As estações são semelhantes às estações das velhas linhas de ferro, porém localizadas entre duas vias de mão dupla e espaçadas a cada 500 metros umas das outras. As vias de mão dupla, que já foram, no passado, propostas em Curitiba, para as canaletas do "Expresso", dão maior velocidade de fluxo, permitindo ultrapassagens enquanto um ou outro veículo esteja descarregando ou carregando em qualquer das estações. Hoje os articulados, em horas de pico, são obrigados a parar, uns atrás dos outros, pois as canaletas dificilmente permitem as ultrapassagens. Em Curitiba, diferentemente de Bogotá, a opção escolhida foi definida pela linha de mão única, pois como se pretendia instalar no futuro o Bonde Elétrico sobre pneus, então se optou pelas estações tubo localizada lateralmente às vias duplas de mão única.
Em Bogotá, conta-se, em aperfeiçoamento ao nosso si tema, com uma tecnologia de informatização que, permite, colhendo o número de passageiros introduzidos pelo sistema, liberar em proporção adequada ao número de usuários no sistema, o número de carros necessários para atender a demanda do circuito, teoricamente otimizando e agilizando o sistema. Tem também, segundo os expositores, um sistema GPS, via satélite, que permite a localização do veículo no exato ponto em que se encontra o que permitiria até mesmo a oferta de um mapa eletrônico de posição do veículo, ao estilo dos metrôs, que tanto serve para orientar o usuário à medida que o veículo se aproxima do destino ou embarque, como para controle de tráfico. Todavia o sistema não este totalmente implantado como pude observar, e no meu particular entender, ainda não teve oportunidade de dar mostras de sua plena capacidade de uso e eficiência, 18.000 passageiros hora conforme afirmam seus defensores.
Há também, um grupo de desvantagens flagrantes. Salvo melhor entendimento do sistema, aquilo que compreendi e me foi mostrado, me fez crer que o sistema proposto, para atender como se deseja, e se propõe a cidade de Bogotá, expandindo-se numa malha que cubra toda á área de uma cidade em espaçamentos de 500 metros, há de ter exigido, obrigatoriamente, do poder publico, altíssimos investimentos, em viadutos, túneis ou transpassos, sinalização, e ainda acessos subterrâneos para as estações centrais, o que implicará em gastos extras vultosos. Sem considerarmos as possíveis desapropriações que são sempre onerosas. Sobretudo, as estações centrais, ali usadas, dificultam o atendimento de deficientes físicos, só como um dos exemplos de problemas a serem mais bem equacionados no futuro. Nesses sentidos o sistema em uso na cidade de Curitiba tem melhor senso, podendo ser aperfeiçoado e permitindo, tecnicamente, esses aperfeiçoamentos a custo reduzido. Quero dizer o sistema de Curitiba pode ser expandido.
Outro ponto que nos chamou a atenção é o de que os investimentos públicos estão fora da avaliação de custos do sistema, pois o sistema de Bogotá conta, segundo seu expositor, com um administrador de sistema público que fica com 3% da arrecadação; uma empresa privada vendedora e coletora de passagens (captadora de dinheiro); uma série de operadores de veículos privados (como é aqui em Curitiba, e que lá, diferentemente daqui, correm o risco do sistema) que ficam 14% do movimento bruto; e, finalmente uma financeira privada que gerencia e aplica os recursos advindos da operação, que fica com o filé. É um grande caça níquel privado, sugando de maneira unificada todo o nicho de usuários de uma cidade com mais de sete milhões de habitantes. Eficiente, mas lamentável estratégia liberal, apresentada sobre discurso socialista.
Uma cidade de um país pobre, com 18 % de desempregados, e que se nós considerarmos também os inativos, as crianças, os adolescentes estudantes e os aposentados, pode-se chegar a mais de dois milhões de pessoas inativas economicamente, o que visto com bom senso, denuncia que o sistema não pode estar funcionando como os promotores de sua defesa pretenderam mostrar. Pretenderam fazer crer que estaria funcionando a plena carga e cobrindo toda a cidade. É impossível. Ou seja, não seria possível implantá-lo sem a ajuda financeira de fontes exteriores à capacidade da cidade. O que significa divida para toda a sociedade.
Também não se explicou como o sistema contribui com os cofres públicos, nem como os investimentos públicos, muito elevado na minha avaliação, possam ser ou estar sendo amortizados. Intuo que o povo colombiano como um todo está contribuindo na construção do sistema de Bogotá, para ser “explorado “por um pequeno grupo privado”.
No mais, não sou conhecedor aprofundado do sistema proposto, e deixo para os expositores, como o competente senhor Ignácio Guzman, ou para os técnicos da Volvo, maior interessada no projeto, que melhorem o discurso de sua defesa. As idéias apresentadas são interessantes, tanto sobre o ponto de vista da informatização do sistema em Curitiba como sob o ponto de vista, (não muito necessário) da localização, em tempo real do veículo (ônibus) via GPS. Este último quesito explica a presença no evento de uma oficial da FAB, Cindata II, muito bem informada, que acompanhava com interesse as questões em debate. A saturação do sistema de satélite na área Metropolitana e no cone de aproximação de aeronaves, se isso for possível tecnicamente, pode trazer conseqüências para a aviação e o controle seguro de aeronaves. No mais ficou para mim a nítida impressão, que em vez de estarmos debatendo alternativas para a cidade, víamos um aparente debate entre Lobbies disputando um nicho de mercado.
Wallace Requião de Mello e Silva
Foi Assessor Parlamentar na Assembléia Legislativa;
Assistente Parlamentar na Câmara Municipal em Curitiba
Secretário Na Câmara Federal em Brasília.