mercredi 11 mars 2009

No tempo de Cassio, o prefeito sorridente.

O VINHO E O ANTIPÓ


Transformar água em vinho foi o emblema do primeiro milagre de Jesus Cristo nas bodas de Canaã. Toda vez que falo em vinho tenho a lembrança de homens e jovens mulheres, num rito de alegria, esmagando as uvas com os pés. Imagens antigas, oriundas de minha infância.
Curitiba na sua região metropolitana, com destaque para Colombo e Santa Felicidade, têm sido boa produtora de vinho ao estilo tradicional. Só quem viveu este momento de alegria, esta dança de Dionísio, este frenesi de Baco, compreende o espírito profundo do que estou querendo dizer aqui.
Afora o vinho, Curitiba tem tido excelentes prefeitos. Inovadores uns, outros profundos no seu sentido de justiça social, outros financistas a cobrir dívidas, outros visionários e até mesmo prefeitos dotados de senso prático, Curitiba teve. Neste sentido a atual administração inova.
Li, em matéria paga oficial, a propaganda sobre o "Plano 1000". Dizem que em quatro anos pavimentarão mil quilômetros de ruas e gerarão com esta atividade quinze mil empregos. Exultei. Nem um gole de vinho eu havia tomado, mas exultei.
Minha mente de artista viu em um piscar de olhos toda a imagem de quinze mil homens pisando com suas botas de borracha e esmagando a emulsão asfáltica, num dançar perfeito, harmonioso, porém menos cheiroso que o esmagar dos frutos da vinha.
Ri, pensando no que faria com tal imagem um Edgar Alan Poe. Escreveria um conto profundo como aquele que entitulou "O Escaravelho de Ouro". Morro de inveja.
Um ano tem 365 dias. Quatro anos 1460 dias. É, afora os feriados, iremos cobrir um quilometro de rua por dia, graças ao bom tempo que sempre nos ajuda. Uma vez empregadas as quinze mil pessoas, creio, estarão envolvidas nesta atividade, isto é, estarão colaborando no trecho, neste quilometro diário. Ora, com esta gente toda, podemos trazer as britas com baldes passando de mão em mão, e derreter a emulsão asfaltica só com o calor e o suor dos braços trabalhando... lindo. Depois ao fim do dia, emoldurados pelo por do sol, resta-nos o dançar. Pisar com pés ágeis o antipó e amassá-lo numa maneira compacta, plana, acabada. É uma metodologia perfeita nestes tempos de desemprego, uma metodologia chinesa.
Feitas as contas, parece, custará aos cofres públicos à bagatela de dez reais ou doze dólares o metro quadrado, como um quilometro de rua tem 10.000 metros quadrados custará 100.000 reais o quilometro. Preço de asfalto em rodovia. Mas empregando-se quinze mil operários, pelo social, justifica-se. Uma estrada como vocês sabem, é uma obra cara, o preparo é outro, a durabilidade do leito é outra, o uso é outro. Mas, não podemos esquecer, são quinze mil empregos. Faça as contas dos salários, verifique o quanto ela corresponde no orçamento de cem milhões de reais, aprenda a pensar socialmente.
Afora estas dionisíacas quimeras, como já dizia, o famoso psicólogo do Globo, José Ângelo Gaiarça, uma imagem diz mais que mil palavras, são boas, é prudente, examinar e interpretar as imagens. A matéria institucional veiculada pelos jornais locais mostra três fotos. Sobre cada foto esta escrita uma palavra. Antes, durante e depois. Na primeira vemos uma imagem de uns setecentos metros de rua ensaibrada... antes. Na segunda vemos uma única máquina, um rolo compressor, e um único funcionário trabalhando... é o durante. Na terceira, vemos um antipó concluído sem a imagem de uma viva alma... é o depois.
Eu acredito no milagre do vinho. Eu acredito no milagre do antipó.
Lá em Santa Catarina, não sei se é porque aquele estado tem nome de santa, o milagre é mais barato, lá em uma licitação feita na praia de Itapema o antipó custa R$3,50 (três reais e cinqüenta centavos) o metro quadrado.
De qualquer modo, endividados como estão o estado e o município, sem dinheiro para fazer qualquer coisa, este plano de antipó, pago provavelmente pelo "Plano Comunitário", isto é, pelo dono do imóvel beneficiado, que terá também o seu IPTU aumentado na seqüência, foi uma saída hábil e inteligente.
Desejo sucesso à prefeitura. A obra, neste momento, é monumental.
Quanto aos quinze mil empregos a serem criados, julgo que o critério que foi utilizado é parecido com o utilizado pela Volvo, que tem 1.770 funcionários registrados, mas alega gerar 40.000 empregos indiretos, ou seja, contam-se os empregados de uma fábrica de parafusos que produz para a Volks, Ford, GM como empregos indiretos. Aliás cada uma destas fábricas conta com estes mesmos funcionários, como sendo gerados pelas suas atividades específicas. A Volvo conta até as domésticas de seus funcionários na Suécia. Assim, ao mesmo estilo o Plano 1000 gerará quinze mil empregos.




Wallace Requião de Mello e Silva
Psicólogo